Há ideias-verdades que moram nas peónias, tenho a certeza, sei!
Dennis Perrin, Peonies in Sunlight
Os seres humanos têm uma particularidade especialíssima que os diferencia de todos os outros habitantes do Universo conhecido, fazem perguntas sobre a sua vida: além do quê e do como querem saber o porquê. Outros animais (que com os seres humanos convivem na Terra) não se interrogam (que se saiba!) sobre a sua vida e nem se questionam sobre o que se passará depois da sua morte. Os seres humanos buscam sentido no seu mundo, são criaturas espirituais. É nessa busca incessante de sentido de significados vitais - o saber navegar à bolina na imaginação - que os seres humanos encontram pequenas pérolas que os transcendem, é aí que moram ideias-verdades que nem um reparo merecem, ideias-verdades que em si guardam (e transportam no tempo) actos primitivos e sagrados: divinos, epigramas de vida eterna em lajes puídas, messiânicos. As ideias-verdades (como as pérolas) vivem sempre em espaços diminutos, sempre são pequenas e nunca por nunca são completas, mais ainda: as ideias-verdades desvelam-se em pequenos relâmpagos de inspiração que iluminam o quotidiano e são elas que lhe dão sentido; são elas, as ideias-verdades, que, debruadas de lonjura e inquietação, lavram no pensamento como lume surdo, são as ideias-verdades que adejam num pulsátil jeito criativo de mimoseio sequioso. Seja como seja, uma coisa é certa: aquela particularidade especialíssima dos seres humanos traduz-se (i) no dom natural de viver no mundo esses momentos de inspiração e (ii) na responsabilidade de capturar e cultivar as ideias-verdades com que esses momentos de inspiração os brindam: momentos de inspiração em que a relação entre o "eu" e o mundo não é a de sujeito-objecto mas antes a relação de ser-no-mundo*. São as ideias-verdades, sim, são as ideias-verdades que fazem especificamente os seres humanos e também são elas que fazem com que o mundo seja muito mais interessante e mais emocionante (na finitude e na infinitude) e ainda mais vivo através da arte. Dado que a arte recompõe exactamente a vida, é em redor das ideias-verdades (que os seres humanos descobrem em si mesmos) que flutuará sempre uma atmosfera de poesia e de criatividade na vida humana, coisa curiosa! Ao cabo e ao resto, as ideias-verdades servem para que os seres humanos evolucionem todos os dias (e cada dia): fazendo e sentindo e sabendo. Eureca! Há ideias-verdades que moram nas peónias, tenho a certeza, sei! Aturdido, sensível à sensualidade das formas e das cores das peónias escorropicho um altivo copinho de geropiga cor de oiro e sinto que poderia pôr agora muito mais liberdade em cada uma das palavras que acabei de escrever, mas fico-me pela admiração, ponto.
* "O mundo é inseparável do sujeito, mas de um sujeito que não passa de um projecto do mundo, e o sujeito é inseparável do mundo, mas de um mundo que o próprio sujeito projecta." (Merleau-Ponty)
Adenda
Com música e memória e memória e uma pergunta: há um limite para a imaginação?
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