(1945 - 2022) A história repete-se? Se não, parece que sim!

"No momento que passa, neste augustioso instante histórico, quando a Europa e o Mundo se debatem na segunda guerra imperialista, quando a mocidade está outra vez condenada a morrer antes de ter vivido a vida, parecerá crime vir falar-vos em Arte ou em Cultura.

Enquanto nós aqui estamos frente a frente, os senhores para me ouvirem e u para vos falar, há aviões despejando toneladas de metralha sobre as principais cidades da Europa, há milhares de pessoas refugiadas nas catacumbas dos abrigos, há navios afundando-se no alto mar. Quer dizer: enquanto nós estamos aqui saboreando a paz, lá fora há guerra. E na guerra, um litro de combustível vale mais do que a Vénus de Milo, um porta-aviões mais do que o Museu do Louvre, o hangar de um aeródromo mais do que a catedral de Reims.

Mas por ser assim, é que, apesar da nossa aparente passividade, nós estamos combatendo; nós estamos, neste momento, empenhados com heroísmo maior, na verdadeira luta que combate uma luta fictícia e falsa; nós estamos lutando pela vida contra a morte, dizendo alto que apesar de a morte ser semeada dia a dia, hora a hora, minuto a minuto, a vida nasce a cada momento e se conservará intacta, para lá de todos os desvairados atentados que no seu próprio seio se criem e se medrem.

Nós estamos afirmando que a Vénus de Milo sempre vale mais do que um torpedo, uma bomba ou um litro de combustível; que o Louvre sempre vale mais do que o Ark Royal; que a catedral de Reims sempre vale mais do que o hangar de um aeródromo qualquer. Mais do que isso, nós estamos afirmando a complexidade , a riqueza e o verdadeiro sentido da vida."

(…)

Almeida, António Ramos, A arte e a vida (conferência), 1945

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