A pose, os sapatos deles, céus, e nos dela o saltinho matreiro


Carta recebida
Sou assim, meu caro (que se há-de fazer!), gosto de escalpelizar fotografias antigas. A que lhe envio deixa-me de franja à banda, a pose, os sapatos deles, céus, e nos dela o saltinho matreiro; a ele, a mania das sandálias perseguiu-o a vida toda, Santo Deus! Nem queria acreditar quando encontrei esta fotografia no meu baú de cerejeira, como é que lá teria ido parar? Quem são eles? Não sabe? Não é possível! Que supina ignorância a sua! Adiante. Dela, a Elsa, hei-de (prometo) falar-lhe um dia destes, demoradamente, e também da Mileva e da injustiça a que a história da ciência a votou, óbvio... Agora vou perder, digo, vou ganhar umas horas (aqui) à voltas dos escritos dele, dos escritos do Albert. Porquê? Ora essa, porquê, porque me interesso pelo estudo do cérebro, e (registe) o confronto do cérebro humano com o Universo sempre foi tendo tendo resultados felizes: um desses resultados foi a epifania daquele maduro há cem anos (Novembro 1915), seja, desde essa data, o nosso mundo alberga buracos negros e provém de uma explosão inicial. Já percebi, meu caro admirador da minha beleza farta (acredita que ainda ruborizo com facilidade, que sina a minha!), já percebi o seu incómodo, não capisca niente, nadica de nada, tem bom remédio, demore-se por aqui. Não tem tempo? E se eu lhe disser que o tempo é uma grandeza física, ajuda? Não? Não mesmo? Olha a novidade, que novidade! Admire a minha surpresa nenhuma!

Adenda (mensagem recebida)
Até que sim, meu caro, até que sim, fez bem em reproduzir a carta que lhe enviei. Ainda não parei de sorrir com as sabrinas do Albert e com o saltinho matreiro da Elsa. Mas imagine só, imagine só, ando às voltas (há muito, muito tempo) sobre o que seria o desenvolvimento da ciência com os procedimentos do direito. Contaram-me, conto-lhe a si, a propósito, um relato curioso, divirta-se. Assim:
Um professor da Faculdade de Direito de Lisboa perguntou a um dos seus alunos: Laurentino, se você quiser dar uma laranja a uma pessoa chamada Sebastião, o que deverá dizer? O estudante: aqui está, Sebastião, uma laranja para si. O professor, furioso: não, não, pense como um profissional de direito. O estudante pensou um pouco, e respondeu: eu, Laurentino Marcos Rosa Sentado, advogado, por meio desta, dou e transmito a título gratuito, Sebastião Lingrinhas, portador do BI n.º 6543254, NIF 50829092, morador na Rua do Alecrim, 32, A, do concelho de Vila Nova de Gaia, casado, com dois filhos e um enteado, e somente a si, a propriedade plena e exclusiva, inclusive benefícios futuros, direitos, reivindicações e outros títulos, obrigações e vantagens no que concerne à fruta denominada laranja, juntamente com sua casca, sumo, polpa e sementes, transferindo-lhe todos os direitos e vantagens necessários para espremer, morder, cortar, congelar, triturar ou descascar com a utilização de quaisquer objectos ou de outra forma comer, tomar ou ingerir a referida laranja, ou cedê-la com ou sem casca, sumo, polpa ou sementes; e qualquer decisão contrária, passada ou futura, em qualquer petição, ou petições, ou em instrumentos de qualquer outra natureza ou tipo, fiscal ou comercial, fica assim sem nenhum efeito no mundo citrino e jurídico, valendo este acto entre as partes, seus herdeiros e sucessores, com carácter irrevogável, declarando Sebastião Lingrinhas que o aceita em todos os seus termos e condições, conhecendo perfeitamente o sabor da laranja, não se aplicando, neste caso, o disposto no Código do Consumidor, cláusula 28, alínea b), com a modificação dada pelo DL 342/08 de 1979. O professor, tolerante: está melhor, mas não seja tão sucinto...

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