Há quem tenha permitido e acaparado um fenómeno complexo
“A
irritação da dúvida causa uma luta para atingir um estado de
crença. Chamarei a esta luta inquirição, embora deva admitir-se
que esta não é, às vezes, a designação mais adequada. A
irritação da dúvida é o único motivo imediato para a luta por
atingir a crença. É certamente melhor para nós que as nossas
crenças sejam tais que possam verdadeiramente guiar as nossas acções
de forma a satisfazer os nossos desejos; e esta reflexão far-nos-á
rejeitar qualquer crença que não pareça ter sido formada para
assegurar este resultado. Mas só o fará criando uma dúvida no
lugar dessa crença. Logo, com a dúvida a luta inicia, e com o
cessar da dúvida termina. Donde, o único objecto da inquirição é
o estabelecimento da opinião. Podemos ter a impressão de que isto
não é suficiente para nós, e que procuramos, não meramente uma
opinião, mas uma opinião verdadeira. Mas ponha-se esta impressão à
prova, e ela revelar-se-á
infundada; pois assim que uma crença firme é alcançada, ficamos
inteiramente satisfeitos, quer a crença seja verdadeira, quer seja
falsa. E é claro que nada fora da esfera do nosso conhecimento pode
ser nosso objecto, pois nada que não afecte a mente poderá ser
motivo de esforço mental. O máximo que pode ser sustentado é que
buscamos uma crença que julgaremos ser verdadeira. Mas pensamos que
cada uma das nossas crenças é verdadeira, e, na verdade, é uma
mera tautologia dizê-lo.”
Peirce,
Charles Sanders, A fixação da crença, 1877, pp. 1- 15
A longa citação (acima transcrita) do pensamento de Charles Peirce tem três desideratos.
O
primeiro, expor
a necessidade
de se ser honesto e justo - de dar o seu a seu dono - esclarecendo a origem do “irritante”, que aqui e aqui (apenas dois exemplos entre muitos) se utiliza a
propósito das relações institucionais entre Portugal e Angola ((suspeito
que, bastas e variadas vezes, o dito “irritante” terá sido (e continuará a
ser) utilizado, aparentemente sem noção segura do que com ele se quer dizer ou explicitar)).
O
segundo, remeter
para a leitura de um atempado artigo
de opinião que começa muito bem ("Em Peirce, o irritante é provocado pela dúvida e aplacado pela crença.") e que termina de uma forma surpreendente, como quem tira um coelho da cartola, assim: há que substituir “os irritantes”
por Princípios do Estado de Direito. Uhm, a ilação com que termina, que se extrai de uma caterva de inuendos, traz água no
bico, é gato escondido com rabo de fora.
O
terceiro, deixar claro que o que parece ser a crença fundamentada é que as
ditas “elites políticas” - em Angola e em Portugal - conheciam muito bem a
origem do muito dinheiro que alimentava (e alimenta!) os negócios (em Portugal) da identificada mulher mais rica de África. Assim sendo, há quem, de forma impune e sem pinga de vergonha, tenha conseguido arrebanhar o que é de todos e há quem tenha permitido e acaparado esse fenómeno complexo, a corrupção.
Adenda
Vale
a pena ouvir, dá que pensar!
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