O engano dos sentidos (1)


As ilusões ópticas são um exemplo - paradigmático - do engano dos sentidos... Na imagem, embora o não pareça, todas as linhas são paralelas.


(Mensagem recebida)
Tinha prometido a mim mesma, meu caro, tinha-me prometido (olhe os meus dedos lindos cruzados) que não mais iria falar consigo sobre a actual situação política em Portugal. Mas esta sua chamada de atenção para o engano dos sentidos acicatou-me. E o que aí vai de "agora governas tu agora governo eu", deixa-me em pulgas e aos saltinhos (ui o que “práívai”: abriram-se as portas e com pequenos passos o novo governo vai dando à costa). Não sabe o que quer dizer “deixa-me em pulgas”? Adiante. Dizem-me (eu até concordo) que parece não haver uma afinidade entre o que os eleitores querem e o que querem os partidos (os partidos em que votam ou em que não votam). Pois é, o busílis da questão assoma-se aí, aposto singelo contra dobrado. Porquê? Ora essa, porquê! Porque os cidadãos eleitores não sabem verdadeiramente o que os partidos querem e porque os partidos não explicam bem o que defendem. Não chega, é curta a minha resposta? Que picuinhas me saiu! Aqui vai um acrescento, seja ele, porque os eleitores desconfiam do que os partidos lhes transmitem  e (deixe de ser picuinhas) porque valorizam outros aspectos que nada têm que ver com aspectos ideológicos ou programáticos dos partidos. São confusas as minhas respostas ou está confuso? Desfasamento… Está à vista um desfasamento (desfasamento rima com inconseguimento, Jesus, Maria)? É o que eu estou a ler na sua mente? Bingo, franja minha, saberes meus, acertou. Esse desfasamento é o reflexo do divórcio entre os eleitores e a política (na substância e na forma).

(Nova mensagem recebida)
As eleições legislativas ocorreram há quinze dias (4 de Outubro). O senhor Presidente da República começa só hoje a ouvir os partidos com deputados na nova Assembleia da República... Explique-me se for capaz!

(Nova mensagem recebida)
Deixe lá, meu caro, deixe lá a política com caruncho, Faça como eu. Venha daí e aproxime-se desta história (estória linda) de amor; e, depois, deixe a sua emoção andar solta e levando a tiracolo o som de uma flauta inca... Tanto a sua frase-poeminha de ontem me agrada e me inspira, Santo Deus! Era para mim, pois não era? Que sabor, que maneira tem a luz da vida de iluminar o meu coração de vidro. Tenho um sorriso a florir nos lábios. Que faço agora? 

(Nova mensagem recebida)
No que toca à sua preocupação, meu caro, com a situação política actual, para ser muito franca, eu não estou muito preocupada, porque seja qual for o governo que resultar do pobre espectáculo a que estamos a assistir, a vida colectiva e o futuro (sim, o futuro) não será muito diferente. Os partidos só falam uns com os outros e não falam para o país e para os seus cidadãos. Somos meros espectadores. Negoceiam as nossas vidas e não dão contas das suas decisões. Penso que para eles é um mero jogo de interesses, não sabem sequer o que os portugueses pensam e querem. Também acho que a grande generalidade dos portugueses não têm competências para decidirem o que querem. Julgo mesmo que não entendem o que se está a passar. Costumo dizer que os portugueses têm os políticos e a vida pública que merecem. Digo isto com tristeza. Costumo sugerir uma consulta Constituição da República Portuguesa. Essa. Essa que ninguém leu. Quantos cidadãos portugueses sabem que a forma de Estado é a República? E que somos um Estado de Direito e o que isso significa? E sabem que no nosso  sistema politico a forma de governo é semi-presidencial? Que nas eleições legislativas se elegem deputados e não se elege um governo? Ouvi frequentemente os jornalistas televisivos dizerem que os portugueses iam às urnas para eleger o novo governo. Olhe, meu caro, a única coisa acertada é a de irmos às urnas, de facto este nosso sistema político está de “cujus”, ou seja, morto! O próprio Presidente da República denega o exercício das suas competências (importantes e daí o semi-presidencialismo): o que justifica o facto de não ter assumido os seus deveres constitucionais e de não induzir os partidos, começando desde logo por ouvi-los a todos, a formarem um governo, sendo o facilitador, se necessário, de entendimentos que sejam consonantes com a representação política, em termos de deputados e partidos, na Assembleia da República em resultado das eleições. As soluções governativas que têm sido aventadas por aí são constitucionalmente possíveis, mas se não estiverem legitimadas pela vontade popular expressa pelo voto, não têm legitimidade política. A legitimidade das decisões reside no povo e na vontade (por este) manifestada. Não reside nos partidos. Também está lá na Constituição. E está lá ainda outra coisa muito importante: o mandato dos deputados é nacional. Assim que são eleitos, cumpre lhes o dever de defender o interesse nacional e coloca-lo  acima dos interesses dos partidos. Eu tenho cá para mim que nem os deputados leram a Constituição e que não passam de comissários dos seus partidos, ao invés de pensarem no bem comum e na seriedade na gestão das coisas públicas e no futuro de todos. Sim, no futuro, porque o passado já não tem remédio e o presente já está estragado... Assim escrevi porque sei o que digo.

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