O contágio das emoções
Há pessoas que, pelas suas palavras, pelos seus gestos, pelos seus olhares, impressionam, subjugam, fascinam. Dizemos até que magnetizam.
1. Vivemos já, cada um de nós, a experiência dessa deliciosa sensação de captura quando não conseguimos prescindir da percepção de um outro! E o que dizer quando uma pessoa que encontramos pela primeira vez nos deixa presos a ela e sentimos prazer nessa prisão?
2. Em 1778, Franz Anton Mesmer médico austríaco, filósofo e músico instalou-se em Paris. Cuidava de nobres e não nobres, de crianças e de velhos, de doentes e de sãos. Dizia-se que graças ao seu magnetismo animal, activado por uma peça de metal, conseguia hipnotizar os homens e sobretudo as mulheres, provocando transes dos quais alguns saíam curados. Foi tal o entusiasmo, a inveja e o ódio que o seu método provocou que o rei nomeou uma comissão para averiguar a existência de um qualquer fluido magnético animal.
3. Em 12 de Março de 1784, reuniram-se os maiores sábios da época. Benjamin Franklin que apenas acreditava na imaginação e Lavoisier que tudo explicava através da química, dirigiram os trabalhos dessa comissão de peritos, encarregada de determinar a utilidade daquele tratamento em medicina, e utilizaram um método de avaliação rigoroso com experiências e contra experiências, com séries repetidas e com perspectivas criticas. A conclusão a que chegaram, foi que nada provava a existência de um fluido magnético e que a acção do médico austríaco podia ser nefasta para as mulheres.
Foi assim que estes peritos responderam à questão…
4. Dois séculos mais tarde, as investigações sobre o vínculo esclareceram este enigma: todo o recém-nascido fica fascinado pela sua mãe. Aquando do nascimento, nenhuma substância e nenhum fluido animal se alteraram e contudo, a simples percepção de um, captura o outro e encanta-o. Trata-se de uma biologia sem matéria, onde a imagem e o som de um (o seu rosto e a sua voz) são suficientes para cativar e encantar o outro. Esta biologia periférica a dois corpos cria uma verdadeira intersubjectividade, onde o mundo mental de um (manifestando-se nas mímicas, nos gestos e na voz (e em todas as formas de exprimir afectos)) tende a modificar o mundo material do outro como um prolongamento do sentimento de si. Ou de outra forma: a emoção de um age sobre a emoção do outro.
5. Os cientistas do século XVIII tinham respondido bem a uma questão mal colocada: com efeito o magnetismo animal não transportava substância nem fluido mesmo que a tristeza de um pudesse ter consequências funestas no outro. Mas isso não impedia que a intersubjectividade tivesse gerado uma transferência de emoções que os sábios da época tinham constatado mas que não sabiam pensar, nem explicar e nem utilizar.
6. Alguns anos mais tarde, Freud inspirou-se neste fenómeno para estruturar a psicanálise e, dois séculos mais tarde, foram os investigadores/práticos do vínculo que explicaram, biologicamente, a intersubjectividade.
7. Estamos conversados: a prova da não substância e do não fluido, fornecida pelos cientistas/sábios escolhidos pelo rei, em 1784, não explicava o fenómeno fundamental do contágio das emoções e, também por isso, não podia, consequentemente entrever a sua natureza umbilical.
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