Variações acerca da premissa kiriloviana, "Se Deus não existe, eu sou deus"
Ontem, dia 15 de Outubro de 2024, F. Nietzsche teria feito 180 anos. São passados cerca de 150 anos e duas guerras mundiais (que mudaram o mundo na primeira metade do século XX), desde que Nietzsche, interpretando ao seu jeito a premissa kiriloviana, afirmou, na segunda metade do século XIX, que a morte de Deus - um acontecimento sem precedentes na história da Humanidade - mudaria radicalmente a existência humana na Terra. Depois da morte de Deus, por/para onde iremos agora?, questionou-se. Iremos pelo mesmo caminho de Kirilov (personagem dos "Demónios" de Dostoiévski)?, terá perguntado a si próprio. Sim, ter-se-á respondido, iremos pelo caminho de Kirilov, pelo o caminho da emancipação de uma vontade dionisíaca sem limites (a vontade de viver e de poder), pelo caminho que levará ao aparecer do super-homem, pelo caminho da instalação do niilismo e dos efeitos do silogismo lógico de Kirilov.
Regressemos ao presente, ao nosso tempo, ao tempo do humanismo*. A verdade dura como punhos é que, nos tempos que correm, o niilismo se tornou uma condição quotidiana, banal e indiferente, com a qual é possível conviver pacificamente. Os seres humanos conseguem viver (e conviver) numa Terra de ninguém, conseguem viver numa Terra que nem é do divino e nem é do humano e nem é dos animais e nem das plantas. Assim é, soprou-me a minha consciência crítica, mas ninguém discordará que esta forma de estar não faz qualquer sentido. Sem o divino, continuou ela, o nada e o tudo passam a ser possíveis: o nada, o mundo e a verdade não existem mais; o tudo, está aí já uma figura/conceito que aproximará a Humanidade de si mesma, uma figura, arcaica e nova, a vida (a vida que é alma).** Perguntas que emergem no pensamento: o que poderá ser um conhecimento que não tem como correlato a abertura ao mundo e à verdade?, o que poderá ser um conhecimento que apenas tem como correlato a vida e a sua errância?, como será possível pensar um sujeito só a partir do erro?.
*O humanismo: na ética, diz "se isso te faz bem, então faz isso"; na política, ensina "é o eleitor quem melhor sabe o que te convém"; na estética, afirma "a beleza está nos olhos do observador".
**Coincidência (ou talvez não!): no centro do último texto escrito por Michel Foucault - La vie: l´expérience et la science - e no centro do último texto escrito por Gilles Deleuze - l´immanence: une vie... - está o conceito de vida.
(msg recebida)
Essa figura/conceito, arcaica e nova, a vida (a vida que é alma), assenta que nem luva de pelica numa nova identificação de cada vivente: antes de ser deus, humano, animal, giesta, amor perfeito, cada vivente é uma vida. Quando, nos meus textos, recorro à expressão "Vida!" que quero eu dizer? Sei eu lá bem! Mas que gosto de uma nova abordagem à noção de vida, lá isso gosto, e também gosto com música de Richard Wagner a tiracolo, porque será?
Adenda, com memória (a propósito da expressão "luva de pelica").
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