Divagação a propósito de uma imagem-tempo e do corpo meio























Há imagens que nos inspiram e que ainda melhor nos inspiram com música (de flauta syrinx) em fundo: são imagens-tempo. Imagens-tempo que fazem apelo às nossas memórias mas que nos afetam por inteiro. Na imagem que encima este texto (em boa hora me caiu do céu com a legenda: que imagem é esta, Senhor?!) há uma narrativa de símbolos e mitos que nos (pro)voca, nos chama a favor de uma digressão acerca da exploração das imagens e das suas potencialidades: na imagem, o destaque vai para a natureza, a água, os corpos, a música, a dança e a beleza (amor e segredos andam no ar, tipo banquete dos sentidos). Nada melhor que, colocando-nos na perspectiva do observador, começar por escolher (como ponto de partida para um solto divagar) uma célebre pergunta de Espinosa (tudo na imagem clama pelo pensamento de Espinosa), esta: o que pode um corpo? Foi Espinosa o primeiro a afirmar que o corpo pode ser afectado e que o poder dos afectos é tal que a única possibilidade de ultrapassar um afecto negativo - uma pulsão irracional - requer um afecto positivo muito mais forte. Duas, apenas duas, das suas fascinantes noções (noções simples e sem adorno) dizem tudo: uma, a mente humana é a ideia do corpo humano; outra, o amor nada mais é do que um estado agradável, a alegria, acompanhado pela ideia de uma causa exterior. Retornemos à imagem: atente-se que os corpos (separados) se misturam, conciliam-se e compõem-se entre si, constituem relações de características mútuas sinónimas de encanto e movimento e destacam a sua individualidade e a sua singularidade. Acontece, no entanto, que quem, enquanto observador, olha a imagem, apenas a vê (animada e provocadora) na tela da sua mente. Desafio interessante (para o observador) seria ultrapassar a corporeidade e entrar com o seu corpo na imagem: imagem onde também todos os outros corpos se animassem e eles próprios (em consciente interacção) se constituissem disparadores de imagens do imprevisível, do experimental e do novo. Nesse bom encontro de cinco corpos, as potências de ser, de agir e de pensar aumentariam exponencialmente. Assim se provaria que bom é aquilo que põe o corpo em condições de ser afectado, aquilo que optimiza a relação de movimento e repouso que caracteriza um corpo na sua incessante actividade em regular a vida e sobreviver. E um corpo humano completo é um corpo e uma mente interconectados: a mente e o corpo são atributos paralelos, são manifestações da mesma substância, Espinosa dixit.
Adenda 1
Ligeiramente a propósito: será mesmo que as plantas pensam?
Adenda 2
... assim fala o Deus de Espinosa.

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