Nas obras de arte mora a poesia do sentido das coisas simples





























Ontologia (numa primeira aproximação) é o estudo do que existe, soprou-me manhã cedinho a minha consciência crítica, eis uma forma simples de dizer que a ontologia é o estudo do Ser enquanto Ser, não complique o que é simples, mande às malvas esse seu rodar de animal puxando à nora. Como é que ela sabe o que eu estou a pensar?, dei comigo banzado a perguntar-me. Tudo bem, seja, repliquei, mas a ontologia não engloba problemas que os seres (humanos) descobrem (que se ocultam e que aparecem e que se mostram) nas características e nas relações entre as entidades (objectos e ideias) que existem? Que filósofo tão complicado me saiu!, suspirou, e: mas sim, o projecto filosófico da ontologia comporta duas etapas fundamentais (i) dizer o que existe, de que matéria a realidade é feita e (ii) dizer quais são as características mais gerais e as relações das coisas simples que são. Como é que é?, retorqui, depois do que acabo de ouvir, eu é que sou o complicado? Fez-se silêncio. Juro a pés juntos que a senti mui afável a sorrir de mansinho, enquanto me sugeria: oiça a Chavela Vargas numa canção linda sobre coisas simples e sobre as relações que entre elas acontecem, perceberá a presença e o desocultamento da verdade das coisas, a presença e o desocultamento das coisas simples são assim a modos como que uma clareira numa floresta do mundo em que reina a ansiedade e o cuidado, tudo o que eu sempre lhe digo: que só atingindo a autenticidade se pode ultrapassar a angústia da existência. Ponha o filosofês do Heidegger em dia e pense muito em mim que sou a parte de si que levanta a questão do Ser: isso mesmo, o cerne da questão do Ser é sair da ocultação e estar presente através da linguagem na existência humana, é isso, isso que agora está a pensar, o Dasein - distendido entre o nascimento e a morte e atirado para o mundo num determinado tempo da história - é um ser-aí, “é um ser (humano) olhado do ponto de vista metafísico da sua consciência essencial de que existe e, além disso, ciente de que existe no mundo”, que é a escola da vida. Atordoado com tanto saber, fiquei alguns minutos a tocar no piano a música das coisas simples. Obrigado minha consciência-fascínio, agora sim, agora sei e não duvido que é através de si que me relaciono com o mundo e também sei que posso abalançar-me a trocar ideias consigo sobre a história da ontologia da arte, nas obras de arte mora a poesia do sentido das coisas simples. Bingo!, consegui o que eu queria!, trauteou ela divertida, gaguejando e sem conseguir parar o riso.

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