O ritmo antigo que há nos pés descalços


O ritmo antigo que há nos pés descalços

Esse ritmo das ninfas copiado

        Quando sob arvoredos

        Batem o som da dança 


Pelas praias às vezes, quando brincam

Ante onde a Apolo se Neptuno alia

        As crianças maiores

        Têm semelhanças breves


Com versos já longínquos em que Horácio

Ou mais clássicos gregos aceitavam

         A vida por dos deuses

         Sem mais preces que a vida.


Por isso à beira deste mar, donzelas,

Conduzi  vossa dança ao som de risos

         Soberbamente antigas

         Pelos pés nus e a dança


Enquanto sobre vós arqueia Apolo

Como um ramo alto o azul e a luz da hora

         E há o rito primitivo

         Do mar lavando as costas.


9-8-1914

Poemas de Ricardo Reis. Fernando Pessoa. (Edição Crítica de Luiz Fagundes Duarte.) Lisboa: Imprensa Nacional - Casa da Moeda, 1994. 

 - 53.

Adenda 1
Para ilustrar quanto o cérebro sabe e exige escapar à realidade que o rodeia (para quebrar as rotinas e aliviar o pensamento), li - uma e outra vez - o poema (acima) de Fernando Pessoa (escrito em 1914); e, de seguida, demorei-me em "Um país de pé descalço", que tão bem Adérito Tavares sabe mostrar. Palavras para quê?
Adenda 2





Há domingos assim: quão grande é a maravilha que mora em "o ritmo antigo que há nos pés descalços"!

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