A fragilidade do mundo sente-se nos pés descalços das crianças















Pois é, pois sim, os humanos são seres emocionais que aprenderam a pensar, lhe disse eu a si em tempo que já lá vai; vem isto a propósito de um livro (que deve ler) sobre a fragilidade do mundo. Sabe que mais?!, céus, estarreci quando o abri (rimou, ups!), então não é que sou eu que estou na capa, por detrás das vidraças? Claro que sim, há muito sei e o digo, há muito sei que nas obras de arte viajam segredos e afectos, mas também viajam nas capas de livros?!, eu não tinha, reconheço, eu não tinha imaginado tal façanha e tão tamanho desaforo (não me pediram opinião e nem autorização). Acordei com apenas algumas franjas do tapete da existência vivida; e encantado, mudo e quedo, ouvi a minha consciência direitinho, ouvi tudo o que ela disse, e disparei impaciente: escusa de dar a volta ao assunto, ficou de responder a uma pergunta que ontem lhe fiz, sou agora todo ouvidos. E ela, diligente e sem resmungar: ena, ena, não se esqueceu, mas hoje não é um dia bom, ainda tenho comigo as imagens dos pés descalços, como é que aquelas crianças conseguiam viver? É horrível, este seu país à beira mar plantado deprime-me, algumas daquelas crianças ainda vivem ou morreram há pouco, foi há tão pouco tempo!, e sim, a fragilidade do mundo, acarinhada na arca da imaginação, sente-se nos pés descalços das crianças, coitadas, meu Deus!, sem eira nem beira, a passarem fome quando calhava, doçuras da vida nem vê-las, ((por aí ainda andam políticos pulhas, alguns deles (e delas) gentinha acéfala) que merecem galés, tenho a certezinha)). Eu, moita carrasco, e ela ainda: defendo e partilho um credo humanístico assente na criação do mundo, e o eco dessa criação do mundo soa em mim sempre que penso em crianças e plantas e animais; daí que o sopro do vento, o marulhar da água, o trigo a sazonar, a ondulação do mar, a terra verdejante, os sons da floresta, o brilho do céu, o reluzir das estrelas - tudo isso é para mim grandioso: quando a Humanidade estava na sua infância os seres humanos emocionavam-se com o que estava por perto e era evidente; porém, desde que a lei ganhou posição dominante, o maravilhamento acabou, a maldade ganhou foros de cidade e a lei moral por vezes mais parece um jogo de bilharda, adiante. Eu, deveras aflito mas de coração ao largo, ainda abananado e sem fala (aquelas imagens são de facto impressionantes e a sabedoria dela é imensa), galguei o tempo, afinei pelo mesmo diapasão e, guardando de Conrado o prudente silêncio, disse de mim para comigo: amanhã é outro dia, ontem adorei saber da existência do Sankofa e parece-me que tem tudo a ver com o Anjo de Benjamin. A minha consciência, emudecida numa afonia prudente, estava de abalada (percebi que sim) e nem se despediu, estava triste, ela é assim, frágil e sensível (quanta riqueza de sentimentos!), generosa até ao último vintém e shakespeariana, é tudo o que há de mais inteligente: pode bater-se com os mais altos sábios dos sábios porque em tudo e tudo é exemplar, sorte minha!

Adenda

A consciência (para cada um de nós) é tudo o que existe.

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