Um país de sol e dó ou a magia da minha consciência crítica


Aí tem, aí tem algo que pode servir para iniciarmos uma conversa de pé de orelha sobre a importância do dito 25 de Abril de 1974, que ontem se comemorou com pompa e circunstância. Com esta tirada (e com a imagem acima projectada na parede branca do meu quarto com janelas de guilhotina), me acordou, manhã cedinho, a minha consciência crítica. Que imagem com tantos gatafunhos!, retorqui, que diabo tem isso a ver com o 25 de Abril de 1974? Gatafunhos uma ova, disse ela, é uma carta cruzada, isso sim, céus, o que eu passo consigo, uma carta cruzada lê-se primeiro de frente e depois de lado, registe; sugiro, continuou ela, que, da mesma forma, leia o 25 de Abril de 1974 na frente (memórias-passado), roda de seguida a carta para a direita (ups!!!) e leia o 25 de Abril de 2021 (percepções-presente). Passado dos carretos, explodi: desde que me explique um pouco melhor essa técnica (bem como as suas vantagens, sublinhei). Vamos a isso, ciciou, oiça. Desde logo, porque economiza papel, e depois porque entre uma e outra escrita moram 47 anos. Nossa Senhora, não está a entender nada, aí tem três exemplos: (1) lê que em 25 de Abril de 1974 havia presos políticos e lê que em 25 de Abril de 2021 há políticos presos; (2) lê que em 25 de Abril de 1974 era objectivo acabar com os ricos e com os pobres e lê que em 25 de Abril de 2021 os ricos estão mais ricos e persistem mais de 2 milhões de portugueses pobres (aqui os efeitos nocivos da pobreza infantil); (3) lê que no 25 de Abril de 1974 a geração entre os 18 e os 50 anos garantiu o funcionamento do país e lê que em 25 de Abril de 2021 dessa geração (agora com mais de 65 anos de idade) morreram só num ano entre 7000 a 10000 portugueses (maldita e desgraçada Covid!) nos ditos Lares (o estatuto de IPSS atribuido a milhares de organizações mais não é que uma prótese débil na mão de Estado social), uma tragédia que poderia (e deveria) ter sido evitada. Estaquei, mudo e quedo e perplexo. E ela: percebo, está sem fala, bom sinal, isso mesmo, o Estado Português devia ser acusado por essas mortes por omissão e por acção: não só não fiscalizou o funcionamento dessas organizações sociais (legais e ilegais) quanto incentivou políticos (no activo e na reforma) a dirigirem e a utilizarem muitas dessas instituições, tendo em vista interesses partidários e corporativos e secretos. Cortei a direito, e acenando que sim (subia em mim uma irritação surda), ouvi-me a dizer: entendi, assusta-me ouvi-la falar assim, sinto-me triste, vou pensar um pouco. Seja como quer, respondeu-me, mas ainda lhe deixo uma outra sugestão para melhor entender o que por aí vai neste país de sol e dó: demore-se neste estudo, vida minha!, descobriram há bem pouco tempo que o cérebro realiza uma espécie de magia para evitar que a percepção e a memória confundam as nossas decisões, seja: o cérebro armazena ambos os registos (percepção e memória) em separado nas duas caras de um mesmo neurónio. Atirei-lhe: quer dizer-me que devo conjugar as minhas percepções presentes com as memórias do passado para me aproximar da realidade? Minha Nossa Senhora, suspirou ela, quão espertinho é, foi por isso que eu o escolhi, gosto e gosto! Ela é que me escolheu?! 

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