"Deus é existirmos e isso não ser tudo" - Fernando Pessoa















William Congdon, Três árvores, 1998

William Congdon pintou o seu último quadro - "Três árvores" - na Sexta-Feira Santa, dia 10 de Abril de 1998, dias antes de falecer, em 15 de Abril de 1998. Olhar o quadro - cuja matéria densa saturada de mensagens é um drama de céu e terra e de dia e de noite e de claridade e sombra - tendo como referência um texto de Proust (abaixo transcrito), será confirmar a certeza íntima de que a arte é o instrumento mais humano que os seres humanos descobriram: para se conhecerem simultaneamente diferentes de Deus e obra sua. É na arte que se esconde e se desvela o (e a aceitação do) mistério da existência; e as lendas - sobre a sacralidade e a beleza e a ordem desse mistérioque se afastam da Terra voltam-se para a Humanidade.

"Meu espírito tinha a sensação de que (as três árvores) ocultavam alguma coisa que não podia apreender. (...) Onde já as teria visto? (...) Ou seria talvez que nunca as tinha visto, e ocultavam sob a sua realidade, como aquelas árvores, como aquele tufo de grama que eu vira no caminho para Guermantes, uma significação obscura, tão difícil de descobrir como um passado remoto, de maneira que, solicitado por elas a aprofundar um pensamento, imaginava eu que reconhecia uma lembrança (...). Em seus gestos singelos e fogosos percebia eu a imponente pena de um ser amado que perdeu o uso da palavra e vê que não poderá dizer-nos o que quer e que nós não sabemos adivinhar (...). Vi como se afastavam as árvores agitando deseperadamente os braços (...). E, quando o carro mudou de direção, virei as costas e deixei de vê-las, (...) e sentia-me tão triste como se acabasse de morrer-me um amigo, de morrer eu mesmo, de renegar um morto ou desconhecer um deus."

(M. Proust, À sombra de uma moça em flor) 

Adenda..., com música eloquente.

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