Não! Interrompi. Sim! Respondeu.












Fiquei, deuses, fiquei de cara à banda, então não é que depois de ter adquirido e usado uma máscara linda - uma réplica de uma obra de arte - , vida e logo eu que sou musa,  então não é que vou ter que regressar à máscara cirúrgica? Pronto, tinha que ser eu, eu que ando a dormir mal nos últimos dias, tinha que ser eu a levar em cima com a desilusão de uma musa inteligente e sábia, ou estou a sonhar ou o meu cérebro avariou, disse (obsediante) de mim para comigo, enquanto me levantava para abrir a minha janela de guilhotina; que dia lindo de sol já está a chegar, ouvi-me dizer, com sol o dia é outra coisa e o perfume da primavera no ar é uma dádiva divina. Aspirei devagar o ar puro da manhã, e descansei-me: vou dormir mais uma horita. Assim fiz. Ela porfiou exibindo dons e saberes, e: não se faça de desentendido, sei de fonte limpa que está mortinho por descortinar o que me aconteceu e o que eu descobri. Curioso de saber (e a tactear cauteloso) não tugi, nem mugi e nem me mexi, fiquei calado e quedo, e ela: foi assim, saiu-me numa rifa este estudo, que li com toda a atenção; minha Nossa Senhora da Sabedoria, então é isso, até me belisquei, continuou ela em jeito de confidência, será bem melhor que todas (e todos) utilizem uma máscara cirúrgica porque a mente daqueles (e daquelas) que nos olham não se distrai e, ao preencher os elementos em falta (no nosso rosto), faz de nós pessoas mais belas. Como é que é? Disparei, só falta dizer-me que, por causa da maldita Covid-19, a obrigação de usar máscara desatou a espalhar beleza pelas ruas. Tenho a certeza, trauteou ela em fundo sorriso e em copiosa ternura contida, tenho a certezinha que o que a mente faz, vendo alguém a deambular com máscara, é preencher o vazio que não vê, a mente dá sempre um sentido às imagens, sabia? Decidi reagir, e entrei no jogo: na percepção das pessoas entram as leis da Gestalt? Bingo, suspirou ela em tom polido, ele (ele sou eu!) conhece as leis da Gestalt, ele sabe que eu, dia sim dia sim, ando com uma fogueira a arder na retina, e rematou assertiva: aí tem a razão que justifica que os rostos cobertos com máscaras cirúrgicas possam ser mais atractivos que os rostos cobertos com outras máscaras, mesmo quando as máscaras sejam preciosididades, quando sejam réplicas de obras de arte, eu o sei. Não! Interrompi. Sim! Respondeu.

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