Memórias e pensamentos (3)

Agora começo a parecer-me com um pássaro, descobri-o ontem no perfil de uma fotografia. Meio pássaro, meio índio velho, raízes à superfície das mãos que tanto amor inventaram, tanto rosto, e tanto, vincos de pensar, vincos de chorar para dentro, vincos de apetecer, penas de pássaro cansado de ninho e sem ninho, penas de sonhar, quase uma ruína, ou mesmo uma ruína, e na qual ainda vibra a mesma semente de juventude, pronta a reverdecer a qualquer hora, como as cordas de um instrumento onde a vida passa os dedos para me ressuscitar.”
Alves Redol, fragmento autobiográfico
Adenda 1
Registe-se este fragmento (autobiográfico) muito curioso, seja:
- os neo-realistas não falavam (ou falavam muito pouco, por pudor quiçá!) de si próprios, dado que, para eles, falar dos outros era uma maneira de falar de si.
Adenda 2 (mensagem recebida)
Santo Deus, vida de Calvino, até que, meu admirador com vincos visíveis de apetecer (e saborear) a minha beleza única e a minha cantada sabedoria, até que o fragmento autobiográfico do Alves Redol me emocionou, vida, imagine que eu até conheço a casa onde ele nasceu, adiante, digo, não adiante, céus, ainda me borbulha na cabeça a imagem do documentário do Proust (minuto 14:38), pode lá ser, xô virgulas, agora é que mesmo adiante. Vamos lá, vou terminar este dia a ouvir os búzios: há dias (o de hoje por exemplo) em que nada enxergo salvo o diverso ser de ser quem sou. Mesmo, pensa mesmo que escrevi uma tirada filosófica? Não, nada disso, não: só assim escrevo quando o meu ingénuo coração se despe e nu vem à escrita para soltar emoções, sentimentos, deleites, sorrisos e até hãhãhãs ao desafio. Sou assim, que quer, sou assim, linda de nascença, enfeitiço, ponto.  

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