Lá tenho eu que comprar outra manta de lã, que sina!

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Bem sei que quer dormir, mas, que se há-de fazer, sempre que leio alguns (note que eu disse apenas alguns) dos seus textos, até sonho acordada, vida quiasmática a minha! Não, disparei sem cerimónias, não é justo que me acorde no meu primeiro sono depois do Natal, e muito menos justo é rapinar-me a minha nova manta de lã merina branca, a manta é minha. Que manta linda, parece de neve quentinha, gosto, ripostou-me a única fada que (pelos vistos) dorme pouco. Neve quentinha, pode lá ser, entrei na conversa (que remédio tinha eu), alguma vez a neve pode ser quente, deixe-se de floreados e devolva-me a minha manta, a manta é minha. Não seja arisco, aprochegue-se a mim, ciciou, e tire as dúvidas: a manta é ou não tipo neve quentinha? É, senti-me a responder, enquanto o hemisfério esquerdo do meu cérebro (cauteloso cérebro intérprete do hemisfério direito, M. Gazzaniga dixit) me prevenia: devagarinho, não percas as estribeiras, calma. Assim fiz, com calma, e descobri, descobri que o adjectivo "quentinha" é tão aumentativo (muito quente) como o é o adjectivo "fresquinha" (muito fresca); e o que mais aconteceu, ficará para as calendas gregas... A sério?! Ouvi-a perguntar-me, vai contar-me um segredo, como é que diz, não me faça rir, diz que eu sou um ser singular, diz-me que eu assumo a minha singularidade construindo a minha vida como uma obra de arte em formas sinuosas perfeitas? Claro que é um ser singular, retorqui, e até penso que (quando sinto a sua presença) sei que é o único ser divíduo no mundo (não tenho qualquer dúvida), que é a razão da minha existência e que é a beleza viva do mistério. Não me deixou continuar, enroscou-se traquinas, e disse com os olhos grandes a falar: sei, ser divíduo quer dizer que eu utilizo na vida as diferentes leituras da realidade que cada um dos meus dois hemisférios cerebrais me mostram, digo, constroem, sou um ser singular divíduo (não indivíduo, registe): gosto, enleios meus quiasmáticos, sou conteúdo e criação permanente, seduzo. Boquiaberto com tanta sabedoria a desvelar-se, fiquei desconcertado e sem saber o que dizer. E ela, olhuda: deixo-lhe uma imagem que o vai fazer pensar e cismar: uma imagem da geometrização fundamental da singularidade de um ponto. Bah, fiquei sem pinga de resposta quando ainda a ouvi dizer: garantem alguns que "Singularidade" será o futuro nome de Deus; eu, meu adorado admirador de mim como sou e como melhor hei-de ainda ser, não acredito; adeus, vou-me com a madrugada e, amanhã passado, empresto-lhe a minha nova manta de lã merina branca, tipo neve mui quentinha... Lá tenho eu que comprar outra manta de lã. que sina!
Adenda
Que vida, uma lesma-do-mar movida a energia solar? Um coleccionador de cornetas a teorizar sobra a evolução? Ainda estão à venda válvulas a vapor? Bolas, também veio à baila a "singularidade"; realizar a verdade da sua diferença, foi o que foi dito? Adiante, às tantas não preciso de comprar uma manta nova: vou, isso sim, à procura do sol...

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