Quão tanta é a insustentável leveza do ser
(Mensagem
recebida)
Ontem, acudam, com reuniões e reuniões (algumas do jeito das maçudas e velhas reuniões do
século XIX) nem tempo tive, meu caro e atento admirador de mim, nem tempo tive
para lhe falar de uma imagem que tem muito de mim: a imagem de uma casa. Interessado
em saber o que penso? Vamos então a isso. Nada melhor que, para lhe desenhar a imagem
de uma casa, lhe desenhar (em palavras) a minha casa. Assim. Primeiro, abro a
porta e uma tela se desvela (rimou, ups): com vivências (algumas assim e outras
assim assim), agitam-se recordações do passado com cores morosas, ilumina-se de
futuro a minha janela de horizonte água em tons de amores-perfeitos. Depois, em
pé descalço e leve, invoco o meu corpo (é o meu corpo que se diz eu) e instigo
a beleza dos dias a trocar impressões comigo: falamos de tudo, da minha túnica azul de andar em casa (a de dormir é outra), e até de mais ainda pequenos pormenores, até dos meus pés delicados e
da minha pele seda, ontem (ai beleza, beleza), adiante, não conto. Só a seguir
(rotinas minhas), depois de um pão centeio, albardado em azeite, ter dado oportunidades às minhas excelentes papilas gustativas, só a seguir ponho em dia telefonemas e
mensagens, escolho um filme (ou uma música ou um livro ou um disco de vinil) e,
almofadas múltiplas para que vos quero: entro nelas como quem viaja em prancha
de surf (leveza minha). Finalmente, logo que as pálpebras (de conluio com os
meus felinos olhos bugalhos) ameaçam cair, bebo água, apago a luz, penso em si e durmo
até ao dia seguinte. Meu caro, meu caro, o que intuo daqui. Também gosto que
pense assim em mim (rimou outra vez, vida): diga-me lá se não é verdade que,
quando lê mensagens minhas, desenha por sobre as palavras imagens queridas à sua
memória? Sim? Mesmo? Desenha com os olhos e fica com as mãos livres? Não! Óbvio, entendo. Quanto
tanta é a insustentável leveza do ser!
Adenda
Pois, claro que sim, a minha casa está cada vez mais bonita, e é minha: mérito meu.
Comentários
Enviar um comentário