Uma rã olhuda que se chama aninhas, pode lá ser!
Saí cedinho, vereda-horizonte à mão de andar, e sentia-me acompanhado…
Claro
que está acompanhado, meu caro, eu estou sempre consigo, mesmo quando fala de
Borges sem saber do que fala, vida minha. Só podia ser ela, linda como sempre e todos os
dias, de cabelo apanhado, calças de ganga com curvas suaves e ténis verdes (mania do
verde!), adiante. Acenou com a cabeça, e a sorrir: sabe bem partir à procura de
coisas, de qualquer coisa. Sorri também, em parte para ela, em parte para a
vereda íngreme à minha frente: que tipo de coisas? Aves, lagartichas, tartarugas, formigas, plantas, flores, ouriços, conhecimentos; acaso sabe que há animais com o nosso nome?
Dei uma gargalhada, ela riu-se também e, a olhar para mim por baixo da franja,
trauteou como quem cantarola: eu conheço margaridas e açucenas e joaninhas e libélulas e sei até de uma
rã olhuda (que vaidosa ela é!) que se chama aninhas. Abanei a cabeça divertido (uma
rã olhuda que se chama aninhas, pode lá ser!); e, zás, fiquei quedo e mudo
quando a ouvi ciciar: as coisas só existem quando olhamos para elas. Vi luz nos
olhos dela, garanto. Delicada, puxou-me de mansinho e eu senti-me a dizer em surdina: então não
olharei mais para elas. Não, não, nada disso, meu caro, nada disso, irá olhar, mas
primeiro beije-me (a beleza da sua forma de ser é imprevisível)... Sei que é difícil alguém acreditar mas, naquele momento, o mundo (deliciado) imobilizou-se só para nós os dois.
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