Ando às voltas e regresso sempre a ti

Este
é um poema
em que tudo é verdade

…/…
em cada palavra o pensamento se revela em latente informação
é um poema valhacouto privado e tudo é verdade sem excepção

(Mensagem recebida)
Valhacouto, Santo Deus, valhacouto privado, raio de poema que diz tudo e não diz nada, as palavras dos verdadeiros poemas não são simplesmente para agradar, percebi, quero dizer: também podem ser um biombo do pensamento. “Valhacouto privado” é então o mesmo que “Poema escondido”. Voilá! Acertei, claro que acertei, meu caro admirador de mim, seja: o poema não revela os seus sentimentos e as suas verdadeiras intenções porque pensa que eu não acredito em si, céus, sou assim, de nascença e vida fora, que se há-de fazer! Pergunta-me se há pensamento sem palavras? Então não! A ideia segundo a qual pensamento e linguagem seriam idênticos é exemplo duma absurdidade de convenção. Pronto, já cá faltava, quer saber o que deve entender-se por pensamento. Vamos a isso. Difícil, é difícil, meu caro, esclarecer esta questão em poucas linhas, mas vamos lá, assim a modos como quem estaciona o carro a andar para trás, rodas para a direita carro para a esquerda, vida. Vamos lá (devagar) esclarecer a questão com quem estaciona num lugar difícil. Primeiro: claro que sim, óbvio, claro que sim, um pensamento completo comporta a linguagem; depois: limitar o pensamento sem linguagem ao inconsciente é cair em banalidades, tipo inconsciente freudiano e inconsciente cognitivo; finalmente: a questão só tem interesse se quisermos falar de pensamento consciente não verbal. Os seus neurónios, meu caro, estão perdidos? Olha a novidade! Eu esclareço o finalmente: pode parecer uma provocação porque sabemos (por experiência própria) que logo que começamos a pensar (melhor dito, a reflectir) as palavras aparecem gaiteiras (por vezes trauliteiras, adiante), mas que é necessário afrontar o dogma da ausência de pensamento sem linguagem, lá isso é… Bem que lhe pergunte: no “regresso sempre a ti” o “ti” sou eu, verdade? Valhacouto, Santo Deus, valhacouto privado, que colorido cortejo de imagens vai na minha cabeça...
Notinha
O meu, digo, o seu poema e a minha mensagem são únicos e completam-se, únicos como nós somos únicos: tenho que os copiar para o meu caderninho argolado. Sabe, meu caro atarantado, sabe, digo, imagina que, no colorido cortejo de imagens que vai na minha cabeça, estou agora a ver lugares (e tempos) e a sentir formas, cores, densidades e odores (céus, ups, rimou). As voltas que o pensamento dá, Santo Deus, Jesus, Maria!

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