Quatro quadras soltas
"Acordo e sai um poema
alguém mo sonhou de noite
só preciso não ser nada
para que a musa se afoite"
...
"Mais que tudo quero ter
pé bem firme em leve dança
com todo o saber de adulto
todo o brincar de criança"
...
"O que chamamos verdade
é coerência inventada
por um saber que imagina
que sabe e não sabe nada"
...
"Só pela graça de Deus
que num feito se revela
pode amar-se uma pessoa
sem se tornar dono dela"
Agostinho da Silva
Adenda (mensagem recebida)
Adenda (mensagem recebida)
Santo Deus, meu caro eterno candidato ao meu afecto,
até que estou de acordo com o conteúdo das quatro quadrinhas do George, moro em
todas elas (sempre eu, só eu, sempre eu, céus!), aquele pensador catita e sábio, vida minha, aposto que tinha um
caderninho argolado, Deus Santo, como é que o George pode ter sido como eu sou?
Ainda a madrugada esfregava os olhos no despontar do dia e já a minha fada preferida, de ténis
verdes e cabelo apanhado (que linda), olhos grandes e narinas pesquisadoras, debitava opinião sobre um tal de George. Quatro quadrinhas, hum, cheira-me a esturro, pensei, e moita carrasco: deixa
ver até onde vai a conversa dela, preveni os meus botões, enquanto a olhava de soslaio. Não se fez de
achada, respirava e sorria felina e olhuda. Tanto o George, como eu, meu admirador dorminhoco, sabemos bem que a
criação de mundos de papel (os nossos caderninhos argolados são mundos de papel) trouxe uma outra visão da condição humana. Ou seja, eu
explico-lhe enquanto acorda e se veste, vamos lá, demore o tempo que quiser
desde que não ultrapasse dez minutos. Levantei-me, percebi que estava a ser
observado e de orelhas fitas ouvi, garanto que a ouvi pensar de pálpebras semicerradas, e nem pestanejei
quando… Veja lá se se despacha, agora não é hora, que atrasado me saiu. Adiante, sempre
lhe digo que quando escrevo nu, digo, quando escrevo no meu caderninho, enfunado de ricas palavras que sussurram para si, sinto-me melhor quer
porque me divirto com as minhas emoções quer porque materializo as minhas
representações; e, depois (oh depois), lendo as frases rabiscadas (acasos e tragédias e risos e lágrimas e até o verniz do céu da minhas formas femininas), posso ver
fora de mim um objecto escrito por mim; e, céus, não estou sozinha porque posso
ver que aquele objecto escrito tem origem no meu mundo íntimo e não modificado
por reacções de um outro, seja, a expressão do meu mundo é só minha, vida, e do
George. Ultrapassou os limites, disparei já pronto para passear mas sem vontade alguma, vem acordar-me
e sempre a falar desse tal de George, chega, se ele é assim tão importante, que
lhe faça bom proveito, vá passear com ele. Minha Nossa Senhora, suspirou, os
seus ciúmes atarefam-me, George é o primeiro nome do seu velho amigo Agostinho
da Silva, não me diga que não sabia... Não! Sim!
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