"cogito ergo SUM": o conto "Quantum"
David Eagleman é o autor do livro "cogito ergo SUM": um conjunto de contos sobre a
"vida para além da morte". Curioso e interessante... O conto "Quantum" glosa o tema quântico da existência
simultânea em vários estados possíveis. Assim:
"Aqui, na vida depois da morte, tudo
existe em todos os estados possíveis em simultâneo, mesmo os estados que
mutuamente se excluem. Depois da nossa vida terrena, isto é um verdadeiro
choque, porque na Terra as nossas escolhas implicam o desaparecimento de outras
possibilidades. Quando nos transformamos em amantes de uma pessoa, não podemos
ser amantes das outras, quando escolhemos uma porta, as outras ficam perdidas
para nós.
Na vida depois da morte podemos desfrutar
de todas as possibilidades ao mesmo tempo, vivendo paralelamente múltiplas
vidas. Damos por nós a comer e a não comer ao mesmo tempo. Estamos e não
estamos a jogar bowling. Estamos a andar de cavalo e ao mesmo tempo não temos
nenhum cavalo perto de nós.
Um anjo azul de pele aveludada visita-nos
gentilmente para ver como estamos a adaptar-nos a esta vida depois da morte.
Isto
é demasiado confuso para um pobre cérebro humano - confessamos ao anjo.
O anjo coça o queixo.
O anjo coça o queixo.
Talvez possamos simplificar esta sua
vida com uma actividade mais acessível, como ter um emprego fixo - oferece-nos.
E caímos imediatamente numa vida laboral
de contradições simultâneas. Estamos a desenvolver várias carreiras ao mesmo
tempo, todas aquelas que ponderámos seguir quando éramos mais jovens. Fazemos a
contagem decrescente para o lançamento do foguetão onde nos encontramos e
simultaneamente defendemos um criminoso em tribunal. No mesmo instante,
desinfectamos as mãos para fazer uma cirurgia à vesícula biliar e conduzimos um
camião de dezoito rodas numa auto-estrada do Novo México. Os constrangimentos
de tempo e espaço desapareceram, completamente.
Isto é demasiado trabalho - queixamo-nos
ao anjo.
Talvez o consigamos sossegar com uma
situação mais simples - pondera o anjo - Gostaria de estar num quarto fechado,
sozinho com o seu amor?
E eis que nos encontramos aqui. Estamos simultaneamente envolvidos na conversa
dela e a pensar noutra coisa qualquer; ela entrega-se a nós e ao mesmo tempo
não se entrega; achamo-la detestável e amamo-la profundamente; ela adora-nos
mas questiona-nos sobre o que terá perdido com outra pessoa qualquer.
Obrigado - agradecemos ao anjo - Esta
existência já me é familiar"
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