Tu queres ver que é ela a professora de violino da Mafaldinha?
Caldeirada de lulas, o
prato fumegando, as lulas gordinhas, as batatas cortadas às lascas, a cebola e o alho e o molho de tom vermelho e os farrapos de pimentos espalhados por cima; ah, mais, e a sala do restaurante (uma adega antiga) tinha memórias na caliça das paredes e sons
nas madeiras velhas e sufixos de palavras gastas nos ferrolhos das janelas, aquilo é muito
bonito. Deixei o prato limpo, o copo vazio, uma delícia!, rematei depois do
café enquanto um suave arroto se escapava lampeiro. Depois é que foram elas. Não
aguentei o hálito reimoso da cebola e do alho, que sina, descobri uma pastilha e vai de mastigar como quem se alivia.
O sabor? Peppermint extra-forte. Soneca de seguida? Óbvio. E um sonho maneirinho? Nem mais. Assim. Como se fosse uma obra de arte, durante o meu sonho, uma fada passeou-se de elegância a tiracolo
pela mornidão das minhas redes neuronais, dialogando com quem passava: olá
como vai, e a família, avô neurónio há quanto tempo o não via, está linda
menina, cada vez mais linda, deixe pralá, sempre bajulador. Mas quando ela passou
pelo bairro dos poetas, parou extasiada (o meu bairro cerebral dos poetas é um
lugar diferente, habitado por pronomes e vírgulas e exclamações e sufixos (que bonita é a casa do se!), no meu bairro
cerebral dos poetas todo o meu corpo se mostra em écrans gigantes numa praça
profana e ao som do violino da Mafaldinha): não acredito, ciciava ela, estou
mesmo a ver aquilo, teso, muito hirto, não acredito, será que a tal de caldeirada de
lulas tinha gindungo nos entretantos? Acordei, que raio de sonho, que caldeirada, pode lá ser, uma fada a passear-se nas minhas redes neuronais, mas que elegante que ela
estava, que linda (porque é que ela é tão linda?), tu queres ver que é ela a professora de violino da Mafaldinha?
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