A lógica da liberdade: o paradoxo de Protágoras


"Da literatura filosófica clássica chegou até nós o seguinte paradoxo: Protágoras aceita ensinar retórica a Euathlus mediante um honorário que o estudante fica obrigado a pagar “se e só se” ganhar o seu primeiro caso em tribunal. Entretanto, Euathlus termina o seu curso de leis mas, contrariamente ao que seria normal e previsível, não aceita defender nenhuma causa. Passados alguns tempos, como a situação se mantivesse e Euathlus não lhe tivesse pago ainda, Protágoras decide levar o próprio caso a tribunal. Perante o juiz deparou-se então um quadro tão curioso quanto paradoxal.
O velho professor argumentava que, se ganhasse a causa, Euathlus teria de lhe pagar o honorário em virtude do veredicto do juiz. Se, em contrapartida, Euathlus ganhasse, como esta seria a sua primeira vitória judicial, teria igualmente de pagar ao velho Protágoras, embora, desta vez, em cumprimento do acordo mútuo que tinham feito. Ou seja, em qualquer uma das situações Euathlus teria de pagar ao professor.
Por outro lado, Euathlus argumentava que, se ganhasse a causa, não teria de pagar em virtude do veredicto do juiz; se, todavia, Protágoras vencesse a causa, como ele (Euathlus) não teria ganho a sua primeira causa em tribunal, não seria obrigado, pelo acordo entre ambos, a pagar os honorários ao professor. Isto é, pelas mesmas razões mas invocadas simetricamente, Euathlus chegava ao resultado oposto ao de Protágoras, isto é, não teria de pagar coisa nenhuma.
Quem tem razão? Como decidir sobre casos como este? Eis, de forma sumária, o tipo de problema que motivou toda uma lógica designada por lógica deôntica e que, fundamentalmente, pode ser definida como a lógica das normas e dos sistemas normativos. De forma mais explícita é uma lógica que pretende estudar o discurso ou raciocínio normativo, envolvendo por isso noções aparentemente tão difíceis de formalizar como “obrigação”, “proibição” ou “permissão”. A sua relevância no direito e em qualquer processo argumentativo é manifesta."
Retirado de (pp. 164-166):
Leite, M da Costa. (2007). O Pedal Estelar, Einstein & Cia – Notas e Crónicas de CTS. Lisboa: Ed. Uni. Lusófonas

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