Como é que a internet afecta o capital social? (1)


Artigo (aqui)
- “Capitalizing on the Internet Social Contact, Civic Engagement, and Sense of Community”  - (2 de Fevereiro de 2002).
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Trata-se de um artigo inserido num estudo mais vasto, este: “Barry Wellman and Caroline  Haythornthwaite (Eds.) (2002). The Internet in Every Day Life. Oxford, UK: Blackwell, Forthcoming
(inserido na Parte IV – The Internet in The Community)
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O objectivo (da Parte IV do referido estudo) é contribuir para o debate sobre os efeitos da Internet no capital social. Assim os autores do artigo integrado nesse estudo (e que aqui se analisa) começam por sentir a necessidade de fazer uma pequena explicação da forma como pretendem contribuir para o debate. Desde logo, dizendo porque é que consideram que a questão “Como é que a Internet afecta o Capital Social?” não é nem uma questão nem trivial e nem obscura. De facto, os autores esclarecem (primeiro), que académicos, peritos e outros puseram e responderam a questão idêntica aquando do aparecimento de outras revoluções (industrial e de informação). Ou seja. Ainda que o foco (dos estudos) pudesse ter sido concentrado – desde a industrialização e burocratização até à televisão e internet – em causas diferentes, a verdade é que três medos são idênticos, medos de: (i) quebras de comunicação na comunidade privada (parentes, amigos, colegas de trabalho…); (ii) declínio da comunidade pública (concentração em espaços públicos, participação em organizações de voluntariado, envolvimento em movimentos cívicos e outros…); (iii) menor envolvimento na comunidade (menos actividades – desporto, teatro, música - que contribuem para o bem estar colectivo). Depois (num segundo momento), referem a existência de trabalhos publicados (Putnam - 1996 e 2000) onde se afirma (e documenta) a tese do declínio (desde 1960) da comunidade americana (pública e privada). Mas como entender (ultrapassar) o facto de Putnam ter analisado (medido) anteriores formas de comunidade e participação quando novas formas de organização da comunidade estavam a acontecer? O que estava em causa não seria isolamento social, mas sim o envolvimento da comunidade em redes sociais: se as pessoas deixaram de ir aos cafés e aos clubes nem por isso deixavam de alimentar outras formas de comunicação online. De seguida (terceiro momento), tendo por base a ubiquidade da Internet, referem a polémica entre aqueles que defendem (utopia) que a Internet permitirá encontrar novos caminhos que reforcem o sentido de comunidade e permitam aceder a mais informação, e aqueles outros (distopia) que defendem que a Internet retirará as pessoas das suas comunidades e empobrecerá as discussões; referem ainda, finalmente, um conjunto de estudos que apontam no sentido de a Internet se integrar na complexidade da vida quotidiana.
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Começa então a ficar claro que a sua (dos autores) contribuição para o debate se concentrará na resposta à pergunta: a Internet aumenta, diminui, ou complementa o capital social? Qual então o caminho a percorrer? O caminho será analisar comportamentos de pessoas em contextos de interacções mais vastos, olhando para (e sob) três formas de capital social: (i) capital em rede (frequência de contactos como amigos e colegas de trabalho); esta é a parte privada da comunidade; (ii) envolvimento cívico (participação em organizações de voluntários, em grupos políticos…); (iii) sentido de comunidade (o capital social é mais que interacção interpessoal e envolvimento cívico, ou seja, quando as pessoas sentem uma pertença forte à comunidade, apropriam e mobilizam melhor o seu capital social; esta é a parte atitudinal da comunidade).
3.1
A metodologia escolhida para responder à pergunta, sustentada pelas três formas de capital social, foi o recurso a uma extensa “web survey” de visitantes norte americanos ((mais à frente saber-se-á que são visitantes dos Estados Unidos (17, 711 - 88%) e do Canadá (2364 – 12%)) do website da “National Geographic Society”, em 1998. Esclarece-se, ainda, que (em 2001) os dados (da “web survey”) já teriam sido objecto de uma análise preliminar que, no estudo que conduziu ao artigo, se alargou: (i) descrevendo com mais pormenor os utilizadores da Internet; (ii) medindo melhor a utilização do uso da Internet; (iii) comparando os contactos online e offline; (iiii) corrigindo análises que tinham feitas sobre o sentido de comunidade.
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Um melhor esclarecimento sobre as três formas de capital social torna-se imperativo. Assim, (i) tipificando o ponto de vista dos utopianos: mostra-se que a internet aumenta o capital social quando se criam novas formas online de interacção social envolvendo as formas offline de interacção; além disso as comunidades online ultrapassam as limitações de espaço e de tempo (Wellman, 2001), promovem discursos democráticos e mobilizam a acção colectiva; acresce que a constituição de comunidades virtuais (Rheingold, 1993) e as relações estabelecidas no ciberespaço se prolongam pelo espaço físico dando origem a novas formas de comunidade, promovendo o aparecimento de “comunidades não locais” dada a facilidade de utilização de comunicação a partir de transportes, locais e lugares diferentes. Esta possibilidade de uma maior comunicação tanto se aplica a pessoas individuais como a organizações e serviços, permitindo mais comunicação e em melhor tempo útil. Refere-se, especificamente, um estudo de Putnam (2000) que atesta que o declínio do capital social é maior nas gerações mais novas…; (ii) tipificando o ponto de vista dos distopianos, mostra-se que: a internet promove o declínio do capital social e promove a alienação interpessoal referindo-se, explicitamente, o resultado de um estudo longitudinal que sugere que a internet está associada a fracos contactos offline e que promove depressão e falta de interesse social ao competir com outras actividades sociais ao longo das 24 horas do dia…; (iii) tentando clarificar como a internet suplementa o capital social, sugere-se que: os efeitos da internet na sociedade são similares aos efeitos da utilização do telefone (facilitando a socialização e evoluindo); seja, a rede internet serve mais para manter os laços já existentes do que para criar novos outros, ainda que suplementando os contactos face a face e os contactos via telefone, dispersando-os geograficamente e facilitando a apropriação do capital social pelas pessoas.
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Os dados da “websurvey” (remetidas para anexo as tabelas e as figuras) são objecto de um tratamento muito específico, tendo em conta o quadro teórico e as variáveis definidas para a análise. Conclui-se: à medida que o recurso à internet entra nas rotinas quotidianas (destaca-se nestas rotinas a importância de movimentos/acontecimentos de serendipidade) o capital social não só aumenta quanto se dispersa geograficamente. Seja. A internet (i) aumenta o capital social e aumenta as formas de apropriação desse capital social: formas de apropriação mais focadas nos laços frágeis e menos nos laços fortes. (ii) Aumenta o envolvimento cívico e desenvolve o sentido de pertencer a uma comunidade online.
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A melhor forma de concluir esta recensão (parece) será transcrever a conclusão que os autores do artigo expressam: “Our research shows no single Internet effect. At a time of spatially dispersed community, the Internet facilitates social contact that supplements face-to-face and telephone contact. At a time of declining civic engagement, the Internet provides tools for those already involved to increase their engagement. At a time of partial identity with multiple personalcommunities, the Internet provides another means for feeling connected  witn friends and kin. Rather than weakening other forms of community, thise who are more active offline are more active online – and vice-versa. In this way, people are incorporating the Internet into their everyday lives even as the Internet is quietly fostering the changing composition of social capital”.
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São identificadas 78 referências bibliográficas, sendo Barry Wellman o autor mais citado: o que não será por acaso, não fosse ele um dos editores do estudo mais vasto e de que o artigo em questão faz parte integrante.
Nota final
O conteúdo do artigo poderá abrir para outros temas relacionados, a título de exemplo, pode abrir para uma aproximação ao pensamento de Zigmunt Bauman: comunidade, redes, laços frágeis e vida humana.

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