De feliz tenho agora os olhos rasos de água

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(Mensagem recebida)
Ainda bem, meu caro, ainda bem que me contou o episódio daquelas galinhas na livraria. A meterem-se consigo a propósito dos livros, que galinholas atrevidas, capoeira com elas, que fracas, fracas são galinhas angolanas, não confunda conceitos. Adiante. Fez bem em se pirar, meu caro, fez bem e eu sei a razão que o levou a dar de frosques: elas não tinham pinga da minha beleza, não tinham, não tinham. Mas digo-lhe mais. Ora oiça. Quando o Ingres me convidou para ser o seu modelo para a "A Odalisca" só impus uma condição: que o meu cabelo ficasse apanhado; daí que eu me não importe que o Jean-Auguste me tenha modificado a anatomia do corpo para mostrar ainda (como se isso fosse possível!) mais sensualidade (manias dele)... Mal eu adivinhava, meu caro, que o excelente Semir Zeki viria explicar (legendas em castelhano) a origem da beleza a partir (também) da imagem de "A Odalisca", Santo Deus, tanto eu fui e sou ainda mais (tantas são as minhas vidas) frágil e linda, até a timidez me fica bem! Não lhe disse ainda mas aproveito e digo agora. Ontem (a noite estava quieta e leda) comi um caldo ralo de cenoura, demorei-me a apreciar o namoro dos pardais no meu terraço de horizonte água; e (ó céus, ó vida) encalhei na minha na minha capacidade demiúrgica do dizer. Esta minha mensagem o prova à saciedade, certo? Certo, óbvio, claro como a água, sem espinhas. Mais. Oiça. Enquanto faço rabiscos no meu caderninho preto argolado, deslumbro-me com a habilidade e a velocidade das minhas perfeitas e maneirinhas mãos de fada. Sou assim que se há-de fazer?! Porquê? Porque é que eu sou assim? Não sabe? Olha a novidade! Quer saber? Quer mesmo saber? Porque eu sou um exemplo feliz do desenvolvimento da inteligência humana, seja, possuo em muito alto grau (supinamente) a capacidade de usar os tempos do passado e do futuro. Pense (perceberá melhor o que eu digo) que os animais têm uma linguagem rudimentar mas utilizam apenas o presente, seja, não sabem conjugar verbos, não sabem simular o futuro... De feliz tenho agora os olhos rasos de água.

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