Houve um Génesis!

Disse-lhe, meu caro, e não me enganei, garanto-lhe. Cheguei tarde mas ainda muito cedo (ui um paradoxo perdido) ao meu apartamento de férias, lindo o meu apartamento, ah pois é! Zazcatrapaz! Quase nem dei por mim a desarrumar as malas, a vontade de estrear o meu biquini2015 mandava mais que eu. Nem uma hora tinha passado, e já eu me dirigia para o meu local preferido da praia do ouro e (tinha que acontecer!) piropo à proa: “ei-la que chega, olha-me aquele andar, tem a beleza de estar acertado com as curvas das ondas suaves”. Adiante. Alisei a areia branca, protegi quatro pedrinhas soltas e a minha toalha estendeu-se ao comprido. Os meus olhos bogalhados espraiaram-se em girândola, e palmilhei uns metros (poucos) para saborear a sonhada entrada na água salgada. Brr, pareceu-me um pouco fria mas aguentei o embate, e nadei tanto quanto me apeteceu; ainda guardei alguns pingos de água antes de confirmar a dádiva da minha toalha acolhedora; dormitei uns minutos e senti os seus dedos trémulos a percorrer-me o rosto e a nuca, faziam-me pensar num cego que quisesse ler na minha pele o texto mais autêntico da minha vontade… Depois foi o jantar; e agora (nesta hora nocturna de luzes desmaiadas e em que escrevo na janela da sala) surge-me uma pergunta curiosa: “porque é que o céu nocturno é escuro?”. Não se esforce, meu caro, não se esforce, a sua proverbial preguiça não me incomoda. Veja e oiça aqui como se resolve o “Paradoxo de Olbers”, e verá que a resposta à pergunta é simples e divertida. Bom, mas sempre lhe digo que foi um escritor americano de estórias de mistério (ó céus, um poeta, quando muito um cientista amador) - Edgar Allan Poe - que, pouco antes da sua morte, publicou um estranho poema filosófico: “Eureka: A Prose Poem”. Pondere, meu admirador convicto, nesta passagem notável: “Se a sucessão das estrelas não tivesse fim, então o fundo do céu apresentaria uma luminosidade uniforme, semelhante á que é produzida pela Galáxia – por conseguinte, não poderia haver absolutamente nenhum ponto, em todo esse fundo, onde não existisse uma estrela. Assim, a única maneira, de, em tais condições, compreendermos os vazios que os nossos telescópios encontram em inúmeras direcções, seria supor que a distância do fundo invisível é tão grande que nenhum raio vindo de lá pode chegar até nós”. E, concluía ele, Santo Deus, que “a ideia é demasiado bela para não conter a Verdade na sua essência”; seja, concluo eu, houve um Génesis, a luz que chega aos nossos olhos tem um atalho finito (não duvide), Jesus, Maria… Houve um Génesis!

Notinha de rodapé
Perdi-me, meu caro, minutos e minutos a fio, a ver e a ouvir e a sorrir deliciada o saber de um cientista curioso. Vá lá, diga que estamos a viver num tempo maravilhoso, mesmo que seja um hífen entre o nada e o ideal... A propósito, quando li o seu último "rubai omariano", disse de mim para mim: o espírito é um brinquedo que a natureza deu aos humanos para eles brincarem aos deuses... Sou única, que se há-de fazer!

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