Um sonho lúcido: a fada de novo

Ocorreu-me agora uma ideia… A fada de novo! Exclamei quando ouvi a voz da fada e ela surgiu suave na madrugada ainda menina. Houve, nesse instante, um comprometido silêncio, arranhado pelo arrastar do meu lençol de linho a ser rapinado (que sina!). Está uma madrugada quente mas um lençol não é ainda um desperdício, não lhe parece? Disse ela, enroscando-se em novelo como só os gatos sabem fazer. Como estava linda! Camisa de noite seda azul com punhos vincados, cabelo apanhado, lábios finos, pestanas a encimar olhos grandes bugalhados e em presente curiosidade. Que terá acontecido? De que ideia me quererá ela falar? Perguntei-me... Lençol, viste-o, rapinado, hábito antigo o dela. A verdade é que uma alegria espontânea precisava-se em mim, fazendo-me aceitar com jovial naturalidade ter perdido o meu lençol de linho: era como se eu retomasse o ritmo vital da sua presença na minha vida, o nosso pecúlio de autenticidade refazia-se depois de esboroado. Estou muito mudada? Perguntou-me movida por um emergente coquetismo. É claro que está mudada, atirei-lhe com firmeza, está mais linda, não admira, cuida-se com esmero..., enquanto interessado lhe afagava o perfil curvilíneo com o olhar. Calei-me antes que a minha impaciência em saber o que a tinha trazido para junto de mim, comprometesse a ideia dela. Disfarcei, pois, procurando ao de leve uma pontinha do lençol mas agarrando o fio do diálogo, eu queria atinar… Oh, oh, meu mais que tudo, segredou-me, e carinhosamente a sua mão acariciou-me o rosto, aí tem a ideia que me ocorreu: não concebo nada de mais enternecedor do que um desastrado Prometeu que queimou os dedos no lume que roubou aos deuses; e, nisto (sorriu), sinto-me absolutamente mulher. Estremeci, as suas palavras pareciam-me um preâmbulo e vinham acompanhadas do sorriso com que a alma tece a vida do amor. A segurança com que ela se permitia abrir o livro dos meus sentimentos e folhear as páginas como quem lê um jornal, deixou-me siderado. Consegui uma coisa rara, sou completa, ciciou no tom de quem se decide a desencadear aquilo que teme. Olhei-a nos olhos, tinha o inquietante fascínio cúmplice da lua em quarto crescente. O tempo (graças aos deuses imemoriais) veio em meu socorro e, sábio nos pormenores, adormeceu atacado por um enxame de preliminares e enfebrecido pela canícula do sangue entumescido. Um silêncio solidário cresceu entre nós e a manhã acordou orvalhada de carícias...

Adenda
Sonhos lúcidos
"Os cientistas estão a investigar uma forma de sonho que, em tempos, foi considerada um mito: o sonho lúcido, ou seja, sonhar quando estamos conscientes. Isto parece uma contradição, mas foi comprovado em exames cerebrais. Nos sonhos lúcidos, os sonhadores sabem que estão a sonhar e podem controlar a direcção do sonho de forma consciente. Embora a ciência só recentemente tenha começado a fazer experiências com estes sonhos, trata-se na realidade de um fenómeno muito antigo e referenciado desde há séculos. No budismo, por exemplo, há livros que falam de sonhadores lúcidos e ensinam as pessoas a tornar-se um deles. Ao longo dos séculos, inúmeras pessoas na Europa escreveram descrições pormenorizadas dos seus sonhos lúcidos. Exames cerebrais de sonhadores lúcidos mostram que o fenómeno é real; durante o sono REM, o seu córtex pré-frontal dorsolateral, que em geral se encontra adormecido quando um indivíduo normal sonha, mantém-se activo, indicando que a pessoa está parcialmente consciente enquanto sonha. De facto, quanto mais lúcido for o sonho, mais activo está o córtex pré-frontal dorsolateral. Uma vez que este córtex representa a parte consciente do cérebro, o sonhador deve estar consciente enquanto sonha."
Kaku, Michio in O futuro da mente, p. 235

Adenda (mensagem recebida)

Interessante, meu caro, interessante este seu sonho lúcido... A propósito de sonhos e realidade..., já lhe falei do David? Há muito, saiba, ele já faz parte da minha "pesquisa Umwelt"! Já ouviu falar na "Potato head"? Não? E nem sabe quem é o David? Oiça então, divirta-se e pense em mim, Vida a minha! 

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