"40 anos de políticas de educação e 5 desafios"

"Existe uma escola, meu caro Luís, quando existe um aluno e um professor"
Agostinho da Silva

1.Esta notícia/entrevista é importante… E é importante por várias razões. Desde logo porque abre o importante tema de "40 anos de políticas de educação em Portugal"; e o tema (pasme-se e sublinhe-se) vem à tona do dia num tempo político conturbado - e não será por acaso - através (também) de alguns dos seus importantes actores; e alguns com muitas e muitas (para o bem e para o mal) responsabilidades políticas acrescidas; por exemplo, a ex-ministra Maria de Lurdes Rodrigues que dá a cara nesta entrevista com frontalidade (e algum ressentimento à mistura), reconheça-se.

2.Acontece que não é com “parangonas” tipo - "estamos a mascarar o trabalho infantil com um ensino supostamente vocacional" - que se defendem perspectivas diferentes na política educativa. A minha ideia (errada por certo) é que quem faz afirmações deste tipo não sabe o que são cursos vocacionais (será possível?!) e nem vislumbra quais foram (e quais sejam) os contornos do flagelo do trabalho infantil.

3.Vamos ao que interessa. O que primeiro está em causa (antes de se definirem as linhas-guia/desafios ao sistema educativo), é saber que a adaptação das crianças ao meio escolar bem como o seu aproveitamento variam estatisticamente e em relação com o seu meio social de origem.

4.Porém, os dados sociológicos e demográficos clássicos que se apoiam em variáveis macrossociais, não conseguem explicar nem o sucesso escolar paradoxal dos alunos originários de meio “popular” nem o insucesso escolar paradoxal dos alunos originários de classes médias e elevadas.

5.Ainda assim... Os trabalhos empíricos mostram que a diferenciação escolar se revela muito cedo, e mostram, desde a escola primária, a destacada influência do nível sociocognitivo inicial dos alunos na sua adaptação escolar posterior. Pondere-se que, desde a escola primária (conscientemente ou não), os professores insistem em actividades, competências e atitudes que muitos dos alunos ainda não tinham desenvolvido...; os professores utilizam termos como aprender, saber, conhecer imaginar que exprimem estados mentais epistémicos não observáveis (enquanto tais); e, apelando a pensar, a discorrer e a raciocinar sobre actividades e sobre situações descontextualizadas, exigem aos alunos que saibam dominar os seus pensamentos de forma reflexiva.

6.Acresce que uma análise (nesses trabalhos empíricos) dos factores susceptíveis de contribuírem para a variabilidade do sucesso escolar, permite concluir que os alunos que têm sucesso escolar, independentemente da sua origem social, são aqueles que fazem prova de atitudes reflexivas sobre as intenções, as significações, os objectos e as actividades de aprendizagem: aqueles alunos que evocam o seu próprio funcionamento cognitivo, as suas maneiras de fazer, de pensar, de aprender… Assim, a compreensão dos estados mentais (os sentimentos, as intenções, as expectativas, os conhecimentos…) parece estar implicada nos processos de construção dos significados pertinentes das actividades e das situações de aprendizagem desencadeadas pelos professores… Ora, é claro que nem todos os alunos chegam à escola com os mesmos recursos em matéria de compreensão dos estados mentais dos outros (a propósito: terá já a ex-ministra ouvido falar na importância da educação da primeira infância, antes da entrada das crianças na escola primária?...; e que diria ela disto?...).

7.Para concluir.... Sim, há que valorizar todo o trabalho já realizado sobre as políticas educativas desenvolvidas nos últimos quarenta anos em Portugal, e há que não ter medo (no futuro próximo) de desenvolver, sem fundamentalismos, alternativas de currículos escolares... Mas também sim, há que pensar (relativamente ao futuro) que não há escolas sem alunos e sem professores. Então não parece que só das características dos alunos e da qualificação dos professores a ex-ministra se esqueceu? Só? Não, esqueceu-se ainda que a qualidade de hoje é a quantidade de amanhã... Tão só!

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