Fome dela, claro que sim, tenho, muita!
Pois saiba que sim, que
sim, que ontem estava nos meus dias, e o que é que fiz, o que é que fiz,
diga-me lá (se for capaz?). Vestido azul, cerúleo e ondulado, lenço lindo de
azul mar e olhos de quem pergunta o que sabe, assim me interrogou a única fada
a quem nunca agrada a resposta “não sei”. Olhei-a, basbaque de todo (que coisas
que eu sentia!) e, buliçoso de surpresa, ouvi-me dizer-lhe que não, que não,
que não imaginava o que é que ela tinha feito… Meu caro, sussurrou, ontem estive sentada numa cadeira de baloiço no meu
terraço (lavadíssimo), e com os meus amores-perfeitos por perto e a fazerem figas (olhe que até me ia
perdendo com as minhas unhas pintadas dos meus pés maneirinhos em divagações de
pele de galinha (imagina porquê, óbvio); deixei que os meus olhos grandes
vagabundassem pelo horizonte de água, e sim, sim, pensei em si, saiba que sim…
Quão divertida e quão agradável fica,
quando assim se expressa em lábio mordido...; e pensou bem de mim? Perguntei-lhe. Ei, ei, ei, pensei em si, não se excite, disse e sorriu, porque me recordei de
uma pequenina conversa que há uns anos tive com o José Gil, ele também é das
filosofias, pois não é?! Siderado, retorqui, que nem por sombras o que eu
penso chega aos calcanhares do pensamento de José Gil… Olhe que não, olhe que
não, suspirou, os dois concordam que
andam para aí uns maduros a roubar o presente; uns desvairados e emplumados que
nos últimos anos desenharam uma situação terrível para o povo português: não
ter futuro, não ter perspectivas de vida social, cultural, económica, e não ter
passado porque nem as competências nem a experiência adquiridas contam já para
construir uma vida… Esse é o pensamento do José Gil, interrompi-a, eu vou um pouco mais longe no meu pensamento; eu penso que o
“empobrecimento” a que estão a obrigar o povo português significa não ter aonde
construir um fio de vida, porque estão roubando o solo do presente que sustenta
a existência dos portugueses, ou seja, o passado já de nada serve e o futuro
entupiu… Chega, meu caro, pediu-me,
chega de filosofias…, olhe agora para mim que sou um fruto carente; esta minha
fome que me vem do coração é tão peremptória e tão forte como a fome que sinto
em si: a sua fome de mim!... Eu tenho fome dela?! Eu?!... Fome
dela, claro que sim, tenho, muita!
Comentários
Enviar um comentário