Um contentamento enfunou-me a alma

Ontem acordei tarde e, estranhamente, cansada. É sempre assim no inverno frio e chuvoso. Devem ser saudades do calor. Ah, agora sem eu esperar, o sol entrou-me pela janela da sala! Que agradável sensação… Mais uma vez a voz melíflua da única fada que tudo recria à sua volta, me acordou com este desabafo tão contagiante, madrugada cedinho; e ela vestida límpida, radiosa, com um sorriso arribado aos seus olhos grandes e com a timidez a espreitar por detrás da sua efusividade. Quando a olhei, linda e descontraída, embasbaquei de vez…, mas um destemido poeminha de Eugénio de Andrade armou-se ao pingarelho: “eis um corpo/estendido/nu/na iminência de ser música”. Soltei um tímido “está tão bonita!”; mas ela despachou-me, emprestando frescura a uma convicta reacção, afável e risonha: há um ser especial e único que mora no meu coração e que pensa em mim, respira em mim, sonha em mim, vive e cria beleza para mim; adoro-o e sou adorada. Pensando que ela não falava de mim, senti-me aflito com a sua sinceridade e com a minha esperteza saloia; esqueci-me (que estúpido) que ela é parente dos elfos e que toda a sua vida é um acto de criação. Quem foi que lhe disse que eu não me estou a referir a si? Perguntou-me, em jeito maneira. O meu calor dilata os corpos.., mantenha-se rijo e saudável para o que der e vier, sussurrou divertida, sem precauções, mãos-concha a ensinar e de franja arrumadinha (mas à banda)... E afastou-se naquele passo que mal toca o chão e que tem qualquer coisa de bailado e de asa.... É verdade, é verdade mesmo, confirmei de mim comigo, que ela é assim: não só faz coisas belas quanto torna a minha vida um lugar de beleza... Um contentamento enfunou-me a alma.

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