Em estilo limpo e sincero. Gosto!

Quando os senhores da razão falam das conveniências, o meu coração fica apertado, as palavras ficam contidas e tenho dificuldade em dizer como estou e como me sinto. Assim se expressou, na débil brisa de um dia de calor, a única fada sempre sincera. Ouvindo o seu desconforto, não pude deixar de pensar quanto a incomodaria não dizer o que sente, ela que é o protótipo da emoção à flor da pele. Resolvi tomar a iniciativa e, provocando-a docemente, perguntei-lhe se não seria interessante retomar o conhecimento dos nossos corpos que respiram… Meu caro, interrompeu-me de rosto lindo a tiracolo, ombro nu chamativo e uma nova infantil curiosidade a desafiar o pensamento, abra um pouco o sentido escondido nas suas palavras. Não me fiz rogado e disse-lhe que devemos regressar aos nossos sentidos numa paisagem natural em que eles estão mergulhados. Quando assim acontece, continuei, damos por nós a habitar um mundo de sensações que estava à nossa espera, mesmo nas margens da nossa consciência… Pois sim, interrompeu-me de novo, deixe que eu complete o seu pensamento porque já sinto o meu nariz acordado e, pelos gestos expressivos das minhas mãos náufragas, pressinto que se aproxima um ataque de gaguez. Claro que sim, por quem é! - Acedi. E ela, com um ar feliz e cúmplice que há muito eu não via, assim completou: … mesmo nas margens da nossa consciência, ou seja, um terreno íntimo impregnado de canto de aves, o ritmo da cantilena dos grilos, os espirros salgados e a luz das estrelas. Como eu adoraria partilhar um momento desses junto de si entre as folhas do crepúsculo! - Exclamei. Vamos regressar, sugeriu ela de olhos brilhantes, mão direita convidativa, voz acesa e um sorriso matreiro a florir-lhe nos lábios, aos nossos sentidos juntos; e, se esse momento acontecer, eu desatarei o meu coração e libertarei as palavras contidas e represadas. Antes que eu pudesse responder, ela desapareceu, sem pisar o chão, na mesma débil brisa de um dia de calor… Em estilo limpo e sincero. Gosto!