Elementar, meu caro

De que valem tantos livros, se não se tem coragem (e uma pontinha de loucura) para viver? Faço-lhe esta pergunta, ouvi a minha fada sussurrar, porque sou capaz de simular, no interior de mim mesma, os seus estados mentais. Consigo saber o que pensa porque utilizo os mesmos sistemas neurónicos para o ser e para o "conhe-ser". Se é como diz e consegue simular os meus estados mentais, qual é então o sentido da sua pergunta? O que pretende que eu diga? - Perguntei. Está a fazer de conta que não percebeu o alcance da minha pergunta, mas eu vou relevar essa sua forma de ser porque o conheço, há muito tempo; e vou tentar responder-lhe com palavras simples, sibilou. Pois bem. Eu simulo, no interior de mim mesma, os seus estados mentais mas é ao seu cérebro que cabe decidir se imita ou não a minha coragem e a minha pontinha de loucura; ou dito de forma ainda mais simples, significa que para viver, um sujeito (fico um pouco apreensiva em o tratar por um sujeito) deve conhecer o autor dos seus próprios actos: ele mesmo. Este "ele mesmo" é comigo?- Interrompi de forma abrupta? Quer dizer-me que o que caracteriza o meu cérebro no foro da acção, é imitar e simular? Mas, ou estou a raciocinar mal ou para que tal aconteça, é necessário implicar, simultaneamente, a existência de um si, a percepção de um outro e o disfarce da acção. Se assim for (que teoria sedutora!), a sua pergunta também parece mostrar que eu existo nos mapas cognitivos da sua identidade e parece sugerir que a cognição sem emoção não tem razão de ser. Será que a sua pergunta foi a forma que encontrou, para dizer que o espaço extracorporal do meu si (que é o meu teatro íntimo onde me vejo como actor no cenário do mundo), é preenchido essencialmente por uma fada que adora livros mas que privilegia a coragem embrulhada em pontinhas de loucura?
Elementar, meu caro. Acaba de abrir uma porta da verdade, concluiu, com um sorriso cúmplice, divertido e galhofeiro.
Sem me dar tempo para lhe responder... E não percebo porquê!

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