Um cão ladrando à Lua
O estudo da percepção mostra-nos que o nosso mundo morfológico está limitado pela gama das nossas capacidades sensoriais, ou seja: conseguimos perceber o que percebem os nossos sentidos. Porém, dado que o nosso universo é contingente, apenas temos acesso a uma das múltiplas realidades possíveis.
Vem esta afirmação justificar uma abordagem à obra de Miró, tentando mostrar que uma taxinomia das suas formas biomorfas é possível: o seu vocabulário de signos é traduzível com uma determinada realidade porque a escolha que ele faz dos signos, tem referências a formas de carácter arquétipo que encontramos nas primeiras manifestações dos desenhos infantis, onde os traços obedecem mais a motivações de prazer sensório motor e obedecem menos a reprodução de um mundo exterior.
Na obra “Um cão ladrando à Lua”, por exemplo, a forma esquematizada de uma escada (que nas obras de Miró ganha o estatuto de um objecto autónomo) torna-se inquietante pois essa escada conduz a um céu vazio: ou, como afirmava Miró, conduz ao infinito. Fixemos no entanto que as obras de Miró não são um exemplo de primitivismo; são antes o resultado de estudos profundos que ele desenvolveu em filosofia, psicologia e poesia: foi este saber que permitiu a Miró transformar as formas em signos gestuais que suscitam uma reacção no apreciador da sua arte; porque soube criar referências comuns e, desta forma, conseguiu modelar uma nova realidade possível num universo contingente, acessível aos nossos sentidos e suscitando uma emoção ou um humor específicos.
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