A coragem, a preguiça e a motivação na escola


A coragem e a preguiça (não confundir com ócio) não são qualidades inatas num ser humano. Resultam, tão só, de determinados contextos e de determinadas situações. Dito de outra forma: não se nasce corajoso ou preguiçoso, acontece-nos. Convém acrescentar que, para este facto, contribuem muitas componentes de uma sociedade muito pouco harmoniosa. Porque, por exemplo no caso da preguiça, o insucesso repetido conduz o ser humano a  um fatalismo passivo.
É o que também acontece com muitos alunos e, particularmente, com alunos identificados como crianças e jovens em perigo. A pouca atenção que dão ao estudo, a inadaptação à escola e às estruturas escolares, o abandono escolar, conduzem à preguiça. E, sendo assim, nunca saborearão o gosto do esforço, se com tempo, coragem e saber não se lhes recrearem situações de necessidade e de evidência, algo que ponha em articulação uma situação e uma acção, uma causa e um efeito.
Atente-se! Quando os valores do ter suplantam os valores do ser, então, não é de admirar que os indivíduos procurem a rentabilidade, exterior e imediata, do menor esforço e deixem de ter a coragem de se valorizarem a si próprios. Talvez, por isso, falar muito cedo de projectos profissionais aos alunos, por exemplo, seja uma forma de contornar, erradamente, a questão da fobia escolar.
Existem, porém, factores de coragem que podem e  devem ser activados na escola: a sensibilização para um ideal, o sentido do maravilhoso, o potenciar um dom inato, o desejo de atingir um objectivo, reconhecer a importância da biodiversidade, conhecer um biótopo, a concretização de projectos colectivos, defender um objecto simbólico, lutar por uma pessoa ou por uma causa.Claro que a preguiça generalizada dos adolescentes mostra, sem dúvida, uma patologia, uma deriva, um disfuncionamento. Sim, mas é altura de não esquecer que preguiça ou coragem, são apenas consequências, respostas a uma determinada situação, não mais do que isso... para que se evitem atitudes maternais de cariz psicológico.
Pensemos um pouco. A força dos valores materialistas colonizou a escola, ao ponto de lhe retirar a sua característica virtude crítica, impondo-lhe regras de empresa e de barbárie económica. A escola tornou-se, assim, um lugar do conformismo, do consensual e do dito normal como no tempo dos sofistas e da escolástica, e deixou de ser o lugar do exercício do espírito crítico como aconteceu desde o século das Luzes.
Mas é no espírito crítico, onde domina a dificuldade, o obstáculo, o perigo, o risco, a necessidade de conhecimento, o ideal, a espiritualidade que a coragem é um valor, implícita e explicitamente reconhecido e desenvolvido pelos alunos. Onde domina a tecnicidade, o materialismo, o conforto, a facilidade e facilitismo, a rentabilidade e a economia, aí sim, a preguiça é um valor, implícita e explicitamente acarinhado pelos alunos.
O meu desejo fica para o fim: que os currículos escolares deixem transparecer a inteligência das coisas e revelem a autenticidade da vida e que coloquem as questões de fundo, a fim de que os alunos (com motivação incentivada) façam o seu caminho nos seus espíritos. Depois veremos todos que a sociedade, através dos ensinamentos dos alunos, se interrogará e se repensará nos seus princípios fundadores.
Vamos apostar?

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